18/12/2001
Confira a entrevista de Bárbara Fálcon com Nengo Vieira!
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 BÁRBARA: Como foi que você começou a se interessar por música?
NENGO: O meu pai, a minha família já tinha um vínculo com a arte; principalmente com a música, muito forte. E eu como o caçula, isso veio a ficar em mim de uma forma mais forte, né? Eu comecei a tocar, por volta de oito anos de idade.

 BÁRBARA: Você nunca pensou em fazer outra coisa?
NENGO: Rapaz... Isso era espontâneo, né? Era uma busca espontânea. E com a música sempre foi aquela vontade, aquele mar de identificação muito grande. Eu sempre gostei. Eu lembro quando eu era pequeno em 67/68, eu sentava, ficava ouvindo as 14 mais, aquelas melhores da semana e fazendo bateria de papelão. Eu viajava mesmo. Enquanto os outros colegas viajavam em outras coisas. E aquilo pra mim, era a melhor coisa que eu podia fazer na minha vida, naquele momento. Aí eu comecei a tocar com oito anos mais ou menos. Comecei a tocar violão e nisso eu acompanhava o meu pai, tocando bandolim em casa e toda a minha família já tinha um envolvimento com música. Aquela fase do tropicalismo, da beatlemania, do iê iê iê, jovem guarda, dos movimentos daquela época. Aos treze anos eu resolvi fazer experiência com banda de baile, a tocar em baile. Tocando baixo, tocando guitarra. Aí depois veio a fase de fazer música. Comecei a tocar guitarra com Chico Evangelista, com Zezé Mota, com Lazzo, Zelito Miranda, com bandas de carnaval, tipo Novos Bárbaros. Quando foi mais ou menos em 81/82, eu via colegas muito menos talentosos que encaravam uma carreira com uma banda atrás deles. Eram pessoas que tinham muita força de vontade, mas que você via que não tinha esse talento todo. Artisticamente falando, não era uma pessoa muito dotada de música. Aí eu botei na cabeça de fazer um show também, elaborar um show. E aí que seu pai entrou na história. A gente começou a ter um envolvimento, compondo junto. Na minha primeira fase de composição. Aí em 82 eu participei de um projeto, esse projeto juntamente com o seu pai, na Fundação Cultural e fiz o show Balançante. Montei um repertório, montei um trabalho, o projeto, o show ensaiado, com cartaz, no ICBA. E foi um sucesso. Eu acho que foram dois dias, com gente pra caramba. O público legal, diferente. Gostaram muito do trabalho. Mas naquela época eu sentia que eu fazia a música com muita emoção. Era uma coisa, tipo um diamante que precisa ser polido, sabe? Muito a coisa da emoção.

 BÁRBARA: Muito intuitivo.
NENGO: É muito intuitivo e emotivo. Foi quando eu conheci Jair Soares, baterista. A partir daí tudo mudou. Jair começou vendo na minha pessoa e no meu trabalho, um trabalho que tinha tudo pra poder reunir a banda Studio 5; que acompanhou Lazzo e que havia feito uma gravação (o compacto Guarajuba). Reunir esses músicos e fazer uma banda, a banda Studio 5, pra segurar e o meu trabalho como suporte. Através do meu trabalho conectar todos os músicos. Em 1983 teve uma viagem pra Feira Nacional de Cultura, lá em São Paulo. Nessa foi Lazzo, foi eu, Zelito Miranda, Jorge Papapá, muita gente dessa época. Na volta de São Paulo, isso já em março, teve uma semana de cultura lá em Cachoeira. Lá a gente conheceu Edson Gomes. E nessa época a gente já tinha uma relação com o reggae. E na verdade, o meu contato propriamente com o reggae se deu em 77, com Beto Marques, na casa dele. Nessa época eu não tinha experimentado ainda a erva, né? Eu me lembro como se fosse hoje, foi com o Rastaman Vibration. Não gostei muito á princípio, achei uma coisa muito repetitiva, sabe? Sem muitos elementos que evidenciassem muita qualidade. Porque o reggae de Bob Marley, principalmente o reggae de Bob Marley, é um reggae muito coletivo. Você não vê uma individualidade aparecendo com muita freqüência, não é? Você vê o conjunto aparecendo com bastante freqüência. É coletividade mesmo. E eu tava acostumado a ouvir coisas mais individuais, mais o lado virtuoso de alguém, Jimi Hendrix, Santana, Beatles. E já o trabalho de Marley tinha tudo. Tinha ritmo, tinha melodia, tinha harmonia. Como se fosse uma orquestra de 15 pessoas tocando e todo mundo aparecia: 3 backing-vocais, metais, percussão, baixo, bateria, teclado, tudo junto ali e as músicas todas bonitas. Aí eu não me identifiquei á princípio. E Beto já tava viajando. Andava pesquisando, doido para fazer o reggae, cantando. Fazia um reggae meio xotado, né? Com elementos do xote bem forte e ficava mais para o xote do que pro reggae. Porque o reggae apesar de ser uma música que chega perto da linha melódica do xote, tem uma coisa peculiar porque o reggae vem do blues. Tá mais pro blues e não é uma música regional. O blues foi uma música que se tornou universal e o xote não. O xote é uma coisa regional que fica aqui á nível de região nordeste do Brasil e na música que se expandia como, com todas peculiaridades que faz com que ela seja uma música regional mesmo. Aí a gente fazia aquela coisa do reggae misturado com o xote. Eu comecei a me envolver, em 79 pra 80, quando eu comecei a experimentar a erva. Comecei a fumar e comecei a ouvir Marley com mais freqüência, com o disco Catch a fire. Então a partir daí foi só reggae em minha cabeça e todas aquelas informações musicais que eu já tinha antes do reggae. Tinha bossa nova, tinha Beatles, tinha samba, tinha chorinho, tinha Novos Baianos, tinha Tropicalismo, todo aquele banco, toda aquela diversidade de música. Aí veio o reggae e aí eu deixei aquele negócio todo de lado, todas aquelas informações. E vi no reggae de Bob Marley uma coisa única, visceral e me identificava de uma forma plena e completa, que não precisava ouvir outros tipos de música. Ouvia Marley de manhã, de noite, de madrugada. Só isso, só Bob Marley.

 BÁRBARA: Por que essa identificação?
NENGO: É porque na verdade, eu não via no trabalho de Bob Marley o que Marley dizia, o que Marley falava. O conteúdo literal de Marley eu vim saber muito depois da música.

 BÁRBARA: Você sabia que era música de protesto?
NENGO: Eu sabia que era uma coisa em relação a essa coisa do protesto do negro, do movimento, mas eu não me adentrava.

 BÁRBARA: Não era a informação, era a música, né?
NENGO: Era a música, os elementos musicais que eu absorvi de uma forma, uma identificação tão profunda, tão grande que era tudo que me satisfazia ouvir. Sufocou total, invadiu com a plenitude total. Aí eu fui morar no Gantois, inclusive com o menino Nelson Rocha, que na época ele fazia rádio. Fazia rádio Itaparica. Tinha um programa na rádio Transamérica, um programa de rock, o Rock especial e ele que apresentava. E ele era a pessoa que ouvia de tudo e ouvia reggae também, só que o reggae como uma outra coisa qualquer, e ele se sentia incomodado dentro de casa. Era Bob Marley o dia todo. Eu ouvia todo dia, mas não enjoava. Quanto mais eu ouvia, mais me dava vontade de ouvir. Gil outro dia falou em uma entrevista que ele ouve Bob Marley, às vezes o dia todo e não enjoa. E se Bob Marley não tivesse existido, se Deus não tivesse criado o Bob Marley, o reggae não ia teria essa difusão que tá aí no mundo.

 BÁRBARA: Com certeza.
NENGO: Essa revolução, criando movimentos aqui no Brasil todo, não é só na Bahia não. No Brasil todo em muitos lugares você vê a poeira do reggae forte. Balançando, né? Então são trabalhos que acontecem de décadas em décadas e olhe lá. É como o rock dos Beatles. Veio pra poder ir de encontro a toda aquela opinião formada sobre tudo, de educação, sistema familiar, sabe? Do pai, do filho e da escola. E Beatles vem para poder desagregar aquilo tudo, derrubar a mesa. Assim foi o trabalho de Bob Marley com a coisa da unificação. A visão de Bob Marley já como compositor, a ideologia dele, de como homem político, da unificação de todo o povo. Ele dizia: “Meu pai é branco, minha mãe é negra, eu não sou nem do lado do branco, nem do lado do negro, sou do lado de Deus, que me criou”.

 BÁRBARA: Quando você ouvia Marley nessa época você já levava em conta essas idéias também?
NENGO: Não, não, não. A princípio não. No princípio era só a música. Eu vim valorizar esse lado dele depois que consegui a informação mais detalhada de como ele vivia, do que ele pretendia fazer com a música, do que o levou a fazer a boa música. Ele valorizava mais a letra do a música e a música dele é de extrema qualidade. Ele uniu o útil ao agradável e ficou uma coisa perfeita, plena e não é descartável. Saltou para a eternidade. Bob Marley é um marco na história musical do mundo, né?

 BÁRBARA: Então essa sua fase de descobrir as idéias dele foi uma coisa mais pra adiante?
NENGO: Foi bem depois. No princípio foi a música mesmo. Quando eu comecei a fazer reggae na verdade, eu já tinha o convívio com Edson Gomes também, né? Porque eu vim ver em Edson, na pessoa de Edson, um grande compositor, de idéias bem definidas, adequadas para a nossa realidade e um cantor do povo mesmo, de falar a linguagem do povo. Quando eu fui pra Cachoeira, em 83, por conta da semana da cultura, Edson já era um compositor formado, um artista já formado, só não tinha banda. Eu já sabia tocar o reggae, eu já sabia os elementos que o reggae precisava e como ele se comportava na música, o baixo, a bateria. Já tinha uma banda, um suporte de banda já definido. E aí quando Jair Soares viu Edson Gomes cantando, ele tocando violão e um vocal com ele, chamou atenção com as músicas Viu, História do Brasil, Malandrinha, Samarina. Músicas já polidas como composição e de uma forma grossa ainda como arranjo, como banda. Aí pintou a idéia de fazer um show aqui no Teatro Vila Velha. Então formamos uma banda e convidamos Edson pra ser uma participação especial. E aí idealizamos o show Negritude Reggae, isso em 83, que pra mim foi um marco. Não sei se na outra parte do Brasil já havia alguém ou um trabalho com uma conexão, com uma identificação, uma definição tão já aprofundada com o reggae, com essa linguagem. Edson Gomes nessa época já era reggae mesmo. Inclusive nós convidamos ele pra ser parte da banda Studio 5, pra ser o cantor da banda. Edson Gomes já queria essa coisa imediata minha do lance do reggae. Na Studio 5 nós éramos mais uma banda de reggae do que uma banda eclética, porque a nossa pegada era reggae, mas tocávamos soul, funk, rock, salsa, o blue. Então fazia essa mesclagem, sendo que o reggae era o nosso maior referencial. E teve na minha pessoa, a que mais ouvia e absorvia o reggae, que ouvia mais Bob Marley, que ficava pesquisando, buscando com aquela ansiedade de querer fazer uma música diferente e dentro desse processo, naturalmente não houve homogeneidade, dentro dessa coletividade de pessoas. O trabalho da Studio 5 nunca foi um trabalho homogêneo. O grupo não subsistiu por muito tempo. Quando terminou a Studio 5 eu comecei a convidar as pessoas para substituírem as que foram saindo. Chamei Sine Calmon, porque Sine já era um afeiçoado, já estudava Studio 5. A Studio 5 já era um referencial musical para ele. Tanto para ele quanto para Marcos Oliveira também. Quando nós tocávamos em Cachoeira eles ficavam na beira do palco. Nessa época eu já tinha uma casa alugada no Alto das Pombas chamada 53, que era tipo uma sede, virou a sede. Em princípio era minha casa, que eu morava com uma figura, não deu certo e eu separei, fiquei sozinho. Aí eu comecei a convidar pessoas pra ensaiar lá. Lá ensaiava Edson Gomes, ensaiava Studio 5, ensaiava Sine, ensaiava Jerônimo, até Raul Seixas chegou a ir lá em casa, numa certa tarde. . Era tipo um albergue, onde as pessoas conviviam num ambiente sadio, um ambiente de coletivo solidário. Se tinha um prato de comida dividia igualmente pra todo mundo e isso a gente fazia na prática mesmo. E essa praticidade foi que nos serviu de suporte não só pra hoje como também para o momento em que nós fundaríamos o grupo Remanescentes, com a proposta de evangelizar as pessoas. Pregar a palavra de Deus, na verdade. Aí ficou essa formação: Jair, Nengo Vieira, Tim Tim Gomes, Valéria, Marcos e Sine. Segundo Edson Gomes, a história de Edson de como Tim Tim chegou a ter um contato com a bíblia, foi quando ele trabalhando lá em Cachoeira, lá no Tororó, olhou no meio dos destroços, do lixo e de uns papéis lá, e encontrou uma Bíblia, a bíblia de Testemunha de Jeová e levou pra casa. E lá ele começou a ter o hábito de ler em casa com a família dele. Aí Tim Tim começou a despertar, com mais interesse, com mais intensidade, com mais profundidade e passou a ser tipo um evangelista da bíblia, né? E ele morando lá em casa, no 53 com a gente, tinha o hábito de acordar cedo, tomar um chá, fumar um e se inspirar, fazer a leitura da palavra. Horas a fio lendo a palavra, interpretando os textos e lendo. Aquilo começou a agir como um óleo lubrificante nos nossos corações, tão enferrujados com esses desprazeres aqui da terra. E começamos a ver a vida de uma forma diferente, colocando Jesus como nosso salvador, nosso Senhor em nossas vidas e começamos a ver o mundo com uma outra visão, com outra mente, né? Com outra dimensão das coisas. A partir daí achamos conveniente e providencial, mudar o nome da banda e o contexto das letras. Pegamos aquele repertório, embrulhamos, jogamos no lixo. E aí Tim Tim veio com o nome, sugerindo Remanescentes, com uma palavra que foi tirada da bíblia, que quer dizer a sobra, o resto. Remanescente, quer dizer a sobra, o restante que ficou e na palavra era dado em Romanos 9:27, falando em relação a Israel O texto bíblico fala: “Ainda que a sua semente seja como a areia do mar, em grande número, só remanescente será salvo”. Então nós nos achávamos a semente remanescente, a semente que ficou, que ficou de bom dessa quantidade de pessoas que são de Israel, mas por serem de Israel não são todos de Deus. Então espiritualmente nós interpretamos isso assim. Então formamos o grupo Remanescentes, com o objetivo de levar através do reggae, o evangelho de Jesus Cristo, a bíblia, a mensagem de Deus. Aí começamos a ensaiar, a formar um outro repertório e como nós já tínhamos uma base de convivência comunitária, coletiva, de dividir coberta, roupa, comida, dividir tudo, passamos a ser um grupo alternativo comunitário, onde nós fazíamos das nossas casas as nossas congregações, onde nós congregávamos. Aí eu constituí família, isso em 88/89, depois veio Sine, depois veio Marcos, Tim Tim, começou a ter os seus filhos. Eu tinha uma casa em Cachoeira, Tim Tim tinha a casa dele em São Félix, Sine tinha a casa dele em Cachoeira, Marcos tinha a dele em Cachoeira. Então essas quatro casas serviam de alicerce como se fossem quatro congregações. Quatro núcleos familiares.

 BÁRBARA: E vocês não se baseavam em religião nenhuma? Era só a leitura da bíblia mesmo?
NENGO: Só a leitura e tinha uma opinião já formada sobre essa coisa de congregação institucionalizada, né? Oficializada e generalizávamos no conceito de eram um bando de fariseus e hipócritas, que existe muito, mas não é generalizado. Então a partir daí ficamos com esse compromisso de evangelizar e o Remanescentes era tido como um grupo que pregava a palavra. Só que nessa época, por sermos alternativos, desvinculados de congregações, nós tínhamos alguns costumes que batiam de frente com essas organizações já estabelecidas, oficializadas. Os costumes, como por exemplo, nós fumávamos erva e achávamos o fumar erva uma coisa de Deus. E a gente se encaixava naquele texto bíblico que dizia: “E criou Deus erva que dê sementes, segundo sua espécie”. A nossa sociedade é uma sociedade hipócrita, que existe inversão de valores. A gente sabe, né? Uma coisa é permissível e uma outra coisa não é permissível. Fumar, eles proíbem. O uso do cigarro é prejudicial á saúde, eles divulgam na televisão. Coca-cola em excesso, café em excesso, tudo é droga. Existe o elemento químico dentro disso aí. Agora a erva é o bode expiatório, paga por tudo. Agora droga é outra coisa. Pra mim o conceito de droga é uma coisa que vai muito além da erva. A erva pra mim é um entorpecente. Uma erva que entorpece. Se você pegar uma erva que mata, uma comigo-niguém-pode e comer ela vai lhe matar. Tem fazer o uso certo, na hora certa.

 BÁRBARA: Me diga uma coisa, vocês não tinham ligação nenhuma com o Rastafarianismo não, né?
NENGO: Não. Muito pelo contrário, nós combatíamos. Combatíamos porque víamos o Rastafarianismo como uma religião de homens, feita por homens. Eles idolatram Hailê Salassiê, um imperador etíope, que é um homem. Então nós víamos nele um ídolo como outro qualquer e um tremendo de um engodo. Então em Cachoeira nós sedimentamos muito essa visão espiritual, onde avançamos até demais, amadurecemos muito espiritualmente e ficamos meninos em outras coisas, em termos de organização, em termos de liderança. Nós éramos um grupo onde a liderança ficou instituída em quatro elementos: eu, Tim Tim, Marcos e Sine. Então eram quatro lideranças, onde a partir do momento que nós começamos a se achar um mais certo do que o outro, um com mais razão do que o outro, conseqüentemente a tendência foi rachar. É inevitável. Então foi o que aconteceu com a gente. Até que rachou de vez, cada um tomou seu rumo e o grupo foi rachado em dois. Eu ainda convivi um ano com Tim Tim, dando continuidade como Remanescentes. Mas não era o mesmo agrupamento, as mesmas pessoas. O nosso trabalho como Remanescentes foi um trabalho que apesar do Nengo Vieira ser o compositor da maioria das canções, mas o trabalho que nós conseguimos fazer durante quase oito anos foi um trabalho muito coletivo. Nós participávamos todos de igual maneira. Nós nos dávamos de total, de coração. Todos os componentes se davam mesmo. Era o meu, o seu, o nosso trabalho. Entendeu? Não importava que as músicas eram mais de Nengo Vieira ou Nengo Vieira era o mais velho, ou que Nengo Vieira é o cara que tocou com mais gente, não importava nada disso, importava o que era nosso. Nós tínhamos consciência disso. Ainda que Marcos Oliveira cantasse duas músicas e que Nengo Vieira fosse o compositor de dez músicas, o valor de Nengo e de Marcos era igual, entendeu? Era uma coisa nossa mesmo. Brigávamos mesmo por isso e a nossa vida tava vinculada a isso. Aí na separação o Marcos e o Sine fundaram o Sojah, ficaram um tempo juntos, como eu fiquei pouco tempo com a Remanescentes. E aí dividiu as quatro partes mesmo. Marcos tomou o rumo dele, Sine tomou o rumo dele, Tim Tim tomou o rumo dele e eu tomei o meu rumo. E foi uma coisa até saudável o Remanescentes ter se faccionado, porque proliferou mais, deu mais diversidade, onde os valores individuais puderam ser mostrados com mais abrangência, né? Porque dentro do coletivo você se adequa ao espaço limitado. Porque na verdade, na verdade, falando espiritualmente, eu senti a mão de Deus pesar e senti que nós não estávamos preparados pra merecer. Porque ia ser uma coisa muito grande. Entendeu? Tanto é que o Remanescentes serviu como referência para hoje em dia acontecer o que tá acontecendo dentro do reggae. O Remanescentes foi uma das causas principais para isso. Onde não foi um trabalho, foram vários trabalhos juntos. O próprio Edson Gomes conviveu com a gente, o Dionorina, o Ubaldo, Geraldo Crystal. Aí vem o menino do Adão Negro, o Serginho, que teve um convívio com Sine também. E foi uma coisa desencadeando outra. Não que um é melhor do que o outro, mas uma coisa propicia a outra. E a gente aprende um com o outro. Eu não sabia compor, mas via Edson compor, aprendi a compor, no meu convívio com Edson. E hoje tá o que tá. Cada um com o seu trabalho. Sine já gravou o terceiro CD, eu tô finalizando o meu segundo, Tim Tim já gravou o dele, Marcos também já gravou o dele e a música reggae tá cada dia que passa aumentando o movimento. Apesar de uma forma sofrida, de uma forma desigual. É uma música que veio de fora, com outra linguagem e chegou aqui e encontrou características culturais pra se desenvolver, pra falar de uma realidade da nossa terra, do nosso povo e na verdade, nós precisamos de líderes. Precisamos de um líder, de um líder ousado, sabe? De um líder que chegue lá e represente a nossa luta, represente a nossa busca, a nossa vontade, a nossa ideologia, o nosso querer, a nossa música, que está sufocada de uma certa forma na mídia, mas que não está morta. Porque nossa garganta continua cantando, os guetos continuam ouvindo, os trabalhos de divulgação continuam sendo feitos, de uma forma que na minha visão, eu acho até um pouco errônea. Estamos encontrando muita dificuldade, porque a música reggae ainda não entrou no mercado, na mídia. Está na boca do povo, tem público, mas o lance da mídia, dos produtores, dos empresários, eles não estão dando crédito. Estão alimentando ainda axé music, a música sertaneja, o country importado, a música romântica, a música brega, essas músicas sem conteúdo, sem ideologia, sem identidade. No pagode é a dança, aquela coisa sensual e do ritmo do samba, o samba é um ritmo muito quente, muito dançante, é o que está sustentando essa parada e não sei até quando vai sustentar. E o dinheiro também sustenta muito essas coisas ainda com altas produções, com televisão, com a mídia. Mas o reggae, como diz Gil, o reggae não está morto, está muito vivo. E Permanecerá vivo.


Fonte: Bárbara Falcón





'Nengo Vieira'


Os Remanescentes: Som originalmente Jamaicano com Nengo Vieira, Marco Oliveira, Sine Calmon, Tintim Gomes, Valéria Leite e outros!


Nengo Vieira lança o seu mais novo álbum, o "Mata Atlântica", nos palcos de São Paulo!






 
Throw Down Your Arms
Professor
Live in Africa

Culture
(Reggae)


O que você espera da cena reggae atual?
Que bandas clássicas ressurjam
Que bandas novas apareçam mais.
A cena reggae está legal para mim.


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